"Não verdade não há um consenso sobre o que é parto humanizado e há muito preconceito também, especialmente entre profissionais que se recusam a sair do modelo "eu faço partos há 20 anos, não é você quem vai me ensinar". Entre essa categoria mais engessada, a fala em geral é: "se eu não faço parto humanizado, eu faço o que? parto de bicho?". Em uma coisa eles têm razão, esse nome não diz nada!
O que faz diferença na
assistência humanizada verdadeira é a atitude de todos. Por isso, se o seu
profissional prioriza o conjunto te preceitos enumeradas abaixo, ele é um
profissional humanizado, dentro desse conceito de humanização.
Vamos a eles! O Parto
Humanizado é:
1) Respeito aos tempos
da mãe e do bebê. Qualquer aceleração do processo, quer indução, aumento
artificial das contrações ou agendamento de cesariana precisa de uma forte
justificativa clínica. Não faz sentido marcar a cesariana porque a mãe está
pesada, e entender isso como "protagonismo feminino". Existem várias
possibilidades de ajuda para uma mãe cansada, e que não desrespeitam o tempo do
bebê.
2) Respeito ao
protagonismo feminino. É importante mudar o olhar e compreender que o parto é
da mulher e que ela tem direito a escolhas e total liberdade. Esse é talvez o
maior desafio dos profissionais e dos serviços. A cada vez que alguém se dirige
à mãe e se diz o que ela deve fazer, já houve um desrespeito a esse
protagonismo. Um exemplo básico, se a mãe chega na triagem e alguém diz:
"por favor, mãezinha, a senhora vai ali naquele banheiro, tira toda a
roupa e coloca essa camisolinha voltada para trás".. BANG! Matou o
protagonismo! Essa talvez é a maior mudança de mentalidade necessária e a
origem de todas as outras mudanças.
3) Compartilhamento de
responsabilidades. O médico não proíbe, não aconselha, não manda. O médico ou a
parteira ou qualquer outra pessoa da equipe mostra sempre as opções e a mulher
escolhe o que ela quer para ela. Mesmo quando parece não haver opção, há opção.
E já que não existem garantias mesmo, o melhor é ser claro, mostrar riscos e
benefícios e permitir que a mulher sinta que está sendo co-responsável por suas
escolhas. Por exemplo: "Sim, você pode tomar analgesia, mas existe um
pequeno risco disso repercutir para o bebê, ou você pode tentar ficar mais um
pouco na banheira, ficar lá com o seu marido e ver se consegue aguentar mais um
pouquinho. Quem sabe possamos reavaliar daqui a 1 hora e já vai estar bem mais
perto de nascer?"
4) Uso das melhores
evidências. Depois de 30 anos de evidências contra o uso rotineiro de
episiotomia, não cabe afirmar que a episiotomia protege a mulher. Hoje em dia
existem claras evidências de que o melhor é deixar o parto acontecer
naturalmente, sem qualquer tipo de intervenção, no ambiente mais simples
possível, com equipes igualmente simplificadas.
5) Levando tudo isso em
consideração, apesar de que uma ou outra mulher possa precisar de analgesia, ou
de rompimento artificial da bolsa das águas, ou um pouquinho de ocitocina em
algum momento, a imensa maioria das mulheres de baixo risco terá, dentro desses
princípios todos, um parto:
- De início espontâneo,
sem indução
- Sem precisar subir em
cadeira de rodas ou macas até a sala de parto
- Sem precisar usar
uniformes específicos
- Em um ambiente
simples, sala agradável (chamadas de PPP), com mobília adequada, com banheira e
chuveiro disponíveis, luz baixa, música a gosto e total privacidade
- Atendido por uma
obstetriz, enfermeira obstetra e/ou médico
- Sem o uso de ocitocina
durante todo o trabalho de parto
- Sem raspagem dos pelos
pubianos e/ou a abjeta lavagem intestinal
- Com liberdade de
alimentação e ingestão de líquidos
- Sem o uso de cardiotocografia
contínua, tendo o coração do bebê avaliado intermitentemente com um sonar
simples, a intervalos regulares de tempo
- Com apoio contínuo
do(s) acompanhante(s) e de uma doula particular
- Com o uso de métodos
não farmacológicos para dor
- Com o uso de analgesia
se necessário, depois de informada dos riscos e benefícios
- Sem ruptura artificial
da bolsa das águas
- Com absoluta liberdade
de movimentos para a mãe durante todo o processo, inclusive durante o período
expulsivo
- Encorajamento das posições
verticalizadas
- Sem episiotomia, sem
empurrar a barriga, sem dedos nervosos na vagina da mulher, sem prender a
respiração para fazer força comprida, sem fórceps, sem vácuo-extrator para
acelerar um processo em que mãe e bebê estão bem
- Sem limites arbitrários
de tempo para o parto e para o período expulsivo, porque o bebê "ainda
está alto", por exemplo
- Com o bebê sendo
colocado imediatamente no colo da mãe com o cordão ainda ligado, mantido
intacto pelo menos até parar de pulsar, e com amamentação a mais precoce
possível
- Sem aspiração das vias
aéreas do recém nascido, separação da mãe, colírio e identificação só após a
primeira mamada, vitamina e vacina só depois de algumas horas e após tempo para
o vínculo mãe-bebê
- Com o uso de
alojamento conjunto desde a sala de parto até o final da estadia
6) O uso de uma
intervenção (ou mais, se necessário) não tira o aspecto humanizado do parto.
Desde que seja necessária no contexto e de que seja dada a escolha para a mãe,
desde que seja, portanto, utilizada em caráter de exceção. E no final, até
mesmo uma cesariana pode ser necessária, e ainda assim é perfeitamente possível
ser calmo, falar baixo, respeitar mãe e bebê sem falar de outros assuntos,
baixar a luz, aquecer o ambiente, e obedecer aos três últimos princípios, que
ocorrem depois do nascimento.
Em suma, o parto
humanizado é um parto o mais natural possível, com o menor número de
intervenções que for possível para aquela dupla mãe-bebê e onde cada
intervenção só seja utilizada quando os seus riscos forem menores do que o
risco de não utilizá-la; onde os tempos, os interesses e a liberdade da mãe e
do bebê sejam os principais motivadores de todos os envolvidos; e o melhor:
tudo baseado em evidências científicas e nas recomendações da Organização Mundial
da Saúde. "
Ana Cristina Duarte Obstetriz
Nenhum comentário:
Postar um comentário